Sistema FAEC/SENAR/SINRURAL

Financiamentos rurais: direito à prorrogação

O Marcos de Abreu e Silva
Assessoria Jurídica – FAEMG

Qualquer banco que atue em crédito rural integra o Sistema Nacional de Crédito Rural. Como tal, exerce uma função de relevante interesse no desenvolvimento social e econômico. É a longa manus do Poder Público. Deve atuar como instrumento de execução da política creditícia e financeira do Governo Federal (art. 19 da Lei 4.595/64), para favorecer as atividades rurais (inciso IX do citado art. 19).

Assim, peca duplamente o banco que nega a prorrogação de vencimento de uma obrigação em crédito rural que, por justas razões, não pode ser paga na data inicialmente prevista. A falta de pagamento decorrente de motivos alheios à vontade e diligência do produtor mutuário nem sempre gera inadimplência contratual. Em certas circunstâncias a possibilidade de prorrogação do financiamento ou da prestação vencida torna-se um direito do devedor, conforme dispõem tanto o artigo 4º da Lei 7.843/89 como o Manual de Crédito Rural – MCR: 2.6.9 (Circular BACEN nº 1.536 de 3.10.89, que, assim, dispõem de modo bastante claro:

Lei 7.843/89

“Art. 4º – (…) Parágrafo Único: Fica assegurada a prorrogação dos vencimentos de operações rurais, obedecidos os encargos vigentes, quando o rendimento propiciado pela atividade objeto de financiamento for insuficiente para o resgate da dívida, ou a falta de pagamento tenha decorrido de frustração de safras, falta de mercado para os produtos ou outros motivos alheios à vontade e diligência do devedor, assegurada a mesma fonte de recursos do crédito original.”

Manual de Crédito Rural – MCR do Banco Central do Brasil:
“Título: Crédito Rural

Capítulo: Condições Básicas – 2
Seção: Reembolso – 6
9 – independentemente de consulta ao Banco Central, é devida a prorrogação da dívida, aos mesmos encargos financeiros antes pactuados no instrumento de crédito, desde que se comprove incapacidade de pagamento do mutuário, em conseqüência de: a) – dificuldade de comercialização dos produtos; b) – frustração de safras, por fatores adversos; c) – eventuais ocorrências prejudiciais ao desenvolvimento das explorações.” 

Por outro lado, a Lei 9.138/95, dispondo sobre o alongamento das dívidas rurais, referindo-se à norma legal retro-citada, confirma tal direito do produtor, indo mais longe, de vez que chega a proibir terminantemente que haja alteração dos encargos financeiros na prorrogação nas circunstâncias acima referidas. O seu artigo 8º não poderia ser mais claro:

Art. 8º – (…) Parágrafo Único: – Em caso de prorrogação do vencimento da operação, ajustada de comum acordo pelas partes ou nas hipóteses previstas na legislação de crédito rural, inclusive aquelas mencionadas no Decreto-lei 167, de 14 de fevereiro de 1967, e no art. 4º, parágrafo único, da Lei 7.843, de 18 de outubro de 1989, os encargos financeiros serão os mesmos pactuados para a situação de normalidade do financiamento.”

Com tais informações, todo produtor rural mutuário em crédito rural que for atingido por uma imprevisibilidade, como as previstas no MCR –2.6.9., deve notificar formalmente ao agente financeiro do evento, com provas de sua ocorrência. Com a informação protocolada corretamente, o mutuário poderá, até mesmo, questionar a exequibilidade de sua dívida. Esta exequibilidade é uma das condições essenciais sem a qual não se pode admitir o processo de execução judicial contra o produtor mutuário em crédito rural.

Vê-se, pois, que o espírito da lei é impor um condicionamento legal à cláusula de pagamento, por reconhecer, no contrato representativo de dívida rural, a aleatoriedade da atividade, e, por conseqüência, dos resultados positivos do empreendimento financiado. A exigibilidade da dívida, portanto, está vinculada ao resultado do negócio, que necessariamente há de resultar na geração da capacidade de seu pagamento pelo mutuário. O banco, quando distribui o crédito rural, tem que estar consciente de que o retorno dos recursos liberados só pode acontecer se o resultado do projeto financiado for bem-sucedido. Tanto que ele, o banco, tem a responsabilidade de fiscalizar o empreendimento. Ele, de certo modo, é parceiro do risco.