As prioridades do abastecimento de água no Estado foram mote para intenso debate entre parlamentares, na manhã de ontem, na Assembleia Legislativa. Entre os pontos abordados, a necessidade de priorizar o abastecimento de água para saciar a sede da população em vez da demanda da indústria e da agricultura. Foi cobrado que os empreendimentos do Complexo Portuário do Pecém (CPP) encontrem alternativas para o consumo da água.
O debate foi provocado por Renato Roseno (PSOL), que, ao subir à tribuna, atribuiu a culpa pela sede da população cearense ao modelo econômico perpetuado por diversas gestões governamentais. “Somos vítimas de um modelo perverso e cruel, que transformou água em mercadoria. Em nome de um pretenso crescimento econômico, governos sucessivamente priorizaram o abastecimento à agricultura irrigada e à indústria”, criticou.
Segundo o parlamentar, 77% dos recursos hídricos do Estado monitorados pela Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos (Cogerh) são destinados à agricultura irrigada e 11% à indústria. “A população fica com o resto”, lamentou. “Somente o açude Banabuiú, o terceiro maior do Estado, está com vazão de sete mil litros por segundo destinados aos grandes empreendimentos agropecuários”.
O socialista ainda apontou que, desde o início da história do Ceará, políticos apresentam propostas de obras hídricas como redenção aos sertanejos. “A todo ciclo político corresponde uma obra hídrica. Teve o Cedro no século 19, o Castanhão no final do século 20”, listou. “Ou a gente enfrenta o problema da gestão da água em toda a sua complexidade, colocando o abastecimento humano em primeiro lugar, ou não vamos resolver”.
Em aparte, Carlos Matos (PSDB) ponderou que nem toda a água consumida pelas empresas serviria para o consumo humano, mas concordou que o problema está na gestão dos recursos, já que há água suficiente para abastecer a população e sobrar. “Temos que ter gestão para priorizar – impacto social em primeiro lugar e, em segundo, o impacto econômico”, reconheceu, destacando que muitas obras amenizaram os efeitos da seca.
Isenção da tarifa
Roberto Mesquita (PV) defendeu que se busquem alternativas para economizar a água, criticando método de irrigação por inundação. “Temos que utilizar outros métodos, como o de gotejamento”, sugeriu. Ele criticou a isenção de 50% da tarifa da água para a MPX (hoje Eneva), concedida na gestão passada. “Na época, Eike Batista era o sétimo homem mais rico do mundo e tinha isenção. Enquanto isso, o pequeno produtor é massacrado”.
Para Mesquita, a siderúrgica, a termelétrica e outros empreendimentos do Pecém devem procurar opções para dessalinizar a água do mar ou tratar a água do esgoto para não consumir em excesso águas provenientes das bacias do Estado. Já Renato Roseno defende que não sejam incentivados empreendimentos que consomem muita água, geram poucos empregos e são altamente lucrativas.
Welington Landim (PROS) endossou o posicionamento de que o Estado ainda está muito atrasado no acúmulo de água e na sua distribuição. Ele disse ser favorável a buscar soluções em países que já conseguiram conviver com a escassez de água, a exemplo de Israel.
Roseno condenou a utilização de agrotóxico e a pulverização aérea feita em plantações no Estado. “É um absurdo que ainda exista pulverização aérea em áreas como o Vale do Jaguaribe, ou na serra da Ibiapaba, poluindo rios, lençóis freáticos, prejudicando a saúde da população”, criticou, destacando o projeto de sua autoria para proibir a prática. “O agrotóxico tem o beneplácito do Estado de não pagar imposto”, completou Mesquita.
O socialista destacou a baixa qualidade da água em reservatórios do Estado, apontando a necessidade de expandir o sistema de tratamento de esgoto. Cobrou que as ações não fiquem só no debate, pedindo apoio aos parlamentares para que produzir matérias efetivas para contornar a situação. “Temos que ter uma agenda prática, com combate ao uso de agrotóxicos, a gestão perdulária da água”, disse.